Há algo profundo na “Big Balls”, música do AC/DC de 1976? É uma canção estranha e até pouco tempo achava ela um ponto baixo na carreira da banda, principalmente na fase dos anos 70.
A música está no fantástico Dirty Deeds Done Dirt Cheap, terceiro álbum de estúdio da banda australiana AC/DC que saiu em 20 de setembro de 1976 A formação era a melhor que banda já teve em toda sua história – Bon Scott cantando, Angus Young e Malcolm Young nas guitarras, Mark Evans genial no baixo e o histórico Phil Rudd na bateria.
É impossível um time como esse fazer algo descartável e eu sempre achei bizarra a canção, mas calma lá: o que temos escondido aqui? Quando ouvi pela primeira vez os acordes iniciais, eu era jovem demais (não para o Rock and Roll) e fiquei curioso. Tinha vezes que adorava, como um daqueles prazeres culposos, coisa que ouvimos escondido, mas tinha horas que irritava os ouvidos.
Ou seja, se incomodava e atraía ao mesmo tempo, tinha coisa boa ali!
Com versos como “Sou da alta sociedade da classe alta, um presente de Deus para a notoriedade nos salões de baile”, o lendário Bon Scott desfilava ironia e entregava uma letra bem espirituosa, como ele sempre fazia. Mas o som, com escalas ascendentes e descendentes, sem aquele peso que todos esperavam – pelo menos eu – da banda, criava uma atmosfera de que algo está faltando. Essa era a intenção. A vida de plástico, que Ruben Blades sempre falava, estava na letra.
Temos um verdadeiro desfile de quinta-série, coisas de duplo sentido a todo momento, palavras inteligentes que colocavam no mesmo patamar festas inúteis da alta sociedade com uma ousadia desenfreada que questionava a razão delas existirem.
Hoje eu gosto do refrão, o ponto mais alto da “Big Balls”: repete sem parar, direto, insistente, mas não irrita. É hilária!
“Eu tenho bolas grandes, são bolas tão grandes e são bolas grandes e sujas”.
Vai dizer que não dá vontade de sorrir com a piada que está acompanhada com um igualmente insistente corinho que casa perfeitamente com a turma do fundão da escola?
Scott segue descrevendo suas “bolas quicantes”, que dominam os salões de baile da alta sociedade. Ele abre um portal de imagens divertidas e sugestivas, algo que o bom e velho Scott faria se alguém se atrevesse a convidá-lo para uma festinha daquelas.
No terceiro verso ele vai direto para os bailes de caridade e festas a fantasia, mas Scott segue provocando que quando suas bolas são manuseadas por puro prazer, é quando ele mais se diverte – mais que festinha de caridade por aparência. É rock and roll, gente, é transgressão pura. Para ele, a diversão verdadeira é a sensação de liberdade que o AC/DC entregava.
No final, Bon Scott vai pro escracho total, como se estivesse ansioso para compartilhar todos os detalhes sobre as suas grandes bolas, personagens indiretas da canção. Coquetéis de frutos-do-mar, caranguejos e lagostins entram na lista de desprezo e ironia da letra, que já está pra lá de engraçada.
Hoje eu me redimo dela. Por anos vivia entre “amo” e “odeio”, mas hoje eu entendo ela como um scherzo, que é como chamamos um alívio cômico na música clássica, mas aqui faz uma pausa para toda eletricidade do disco Dirty Deeds.
Eu me rendo!
Já falamos sobre AC/DC no Antigas Novidades, aliás.
Aroldo Antonio Glomb Junior é Athleticano e jornalista.